"Pessoas
livres não são iguais, e pessoas iguais não são livres".
Gostaria
muito de saber quem foi a primeira pessoa a proferir essa máxima. Ela certamente está entre as maiores verdades
de todos os tempos, uma que é ao mesmo tempo simples e repleta de profundos
significados.
A
igualdade perante a lei — por exemplo, ser julgado inocente ou culpado
baseando-se exclusivamente em você ter cometido o crime, e não em sua
cor, gênero
ou crença — é um ideal nobre ao qual nenhuma pessoa de bom senso se
opõe. Por isso, não é o tema deste artigo. A "igualdade" a que a frase
acima se refere
está relacionada à renda econômica e à riqueza material.
Colocando
de outra maneira, portanto, a frase pode ser lida da seguinte forma: "Pessoas
livres terão rendas distintas. Em arranjos nos quais as pessoas têm
obrigatoriamente a mesma renda, elas não podem ser livres".
A
igualdade econômica em uma sociedade livre é uma miragem com a qual os redistributivistas
sonham — e frequentemente se mostraram muito dispostos a derramar sangue para
implantá-la.
A
questão é que indivíduos livres são indivíduos intrinsecamente diferentes entre
si, de modo que não deveria ser surpresa nenhuma o fato de que eles terão
rendas distintas. Nossos talentos e
nossas capacidades não são idênticos.
Nem todos nós trabalhamos com o mesmo afinco, com a mesma dedicação e
com a mesma qualidade. Cada um de nós
nasceu em famílias distintas, sendo que cada família possui suas vantagens e
suas desvantagens. Também nascemos em
diferentes vizinhanças, somos cercados por diferentes tipos de pessoas,
recebemos diferentes tipos de incentivos e temos diferentes graus de oportunidade.
É
até compreensível que, perante esse ponto
de partida desigual, os progressistas queiram remediar a situação
implantando políticas governamentais "corretivas". O que eles realmente não entendem é que a
cura que eles propõem é muito pior do que doença. Qualquer tentativa de corrigir desequilíbrios
nas famílias e nas vizinhanças irá gerar outras desigualdades que podem ser
piores do que as originais.
Thomas
Sowell certa vez disse que "Tentativas de se equalizar os resultados econômicos geram desigualdades maiores e
mais perigosas de poder político". Ou, como concluiu Milton Friedman, "Uma
sociedade que coloca a igualdade à frente da liberdade terminará sem as
duas. O uso da força para alcançar a
igualdade irá destruir a liberdade, e a força, introduzida com bons propósitos,
irá terminar nas mãos de pessoas que irão utilizá-la para promover seus
próprios interesses".
Ademais,
mesmo se todos nós, magicamente e subitamente, passássemos a ter a mesma
riqueza, já no dia seguinte voltaríamos a ser desiguais, pois alguns iriam
gastar seu dinheiro e outros iriam poupá-lo.
Em
uma economia de mercado, rendas distintas sempre serão uma realidade. E tem de ser assim. Essa diferença de renda ocorrerá em
decorrência de fenômenos tão distintos quanto incontroláveis, como talento nato,
ambição, energia, disposição, saúde, sorte, percepção correta quanto às
demandas do consumidor, parceria com as pessoas corretas etc. Sendo assim, a igualdade econômica só poderá
ser tentada (mas nunca alcançada) por meio de monstruosas e contínuas agressões
empreendidas por funcionários do governo.
O resultado mais provável será uma igualdade de miséria (muito embora os
membros da elite política serão mais iguais do que o resto do povo). Igualdade a um nível decente de prosperidade
é algo que está muito além da capacidade do estado, como bem ilustram Cuba e
Coréia do Norte.
Para
produzir uma mínima quantidade de igualdade econômica, os governos teriam de
expedir as seguintes ordens (e estar disposto a impingi-las com pelotões de
fuzilamento e agentes carcerários): "Não se sobressaia, não trabalhe com mais
afinco do que seu vizinho, não tenha boas e novas ideias, não corra nenhum
risco, e não faça nada de diferente em relação ao que você já fez ontem".
Em
outras palavras, não seja humano.
Pessoas
obcecadas com igualdade econômica — ou, para empregar um termo mais
clínico,
com o igualitarismo — tendem a fazer coisas estranhas. Elas se tornam
invejosas. Elas passam a cobiçar o que é dos outros. Elas dividem a
sociedade em dois grupos:
vilões e vítimas. Elas gastam mais tempo
e energia tentando derrubar e destruir uma pessoa bem sucedida do que se
esforçando para se aprimorar, para se tornar uma pessoa melhor e, com
isso,
subir na vida. São pessoas ressentidas e
rancorosas, e não é nada divertido estar perto delas. Quando tais
pessoas eventualmente conseguem
chegar ao poder, os estragos que elas fazem podem ser irreversíveis.
Elas não mais apenas chamam a polícia; elas
passam a ser a polícia.
Se
a desigualdade econômica é uma opressão, punir o esforço, o mérito e o sucesso
não é uma cura. Medidas coercivas que
visam à redistribuição de riqueza farão apenas com que os espertos e os
politicamente bem-relacionados enviem sua riqueza para o exterior ao passo que
os desafortunados terão de arcar com o fardo do inevitável declínio econômico. Uma medida muito mais produtiva seria reduzir
o imenso e burocrático aparato governamental — que, com suas regulações que
impedem a livre concorrência, com sua inflação que destrói o poder de compra,
com suas tarifas de importação que proíbem a aquisição de produtos bons e
baratos do exterior — faz com que os pobres se perpetuem nessa condição.
Por
outro lado, é fato que há algumas formas de desigualdade econômica
condenáveis. Por exemplo, a desigualdade
produzida por um capitalismo mercantilista, no qual o estado — por meio de
agências reguladoras, tarifas de importação e subsídios — protege os grandes
empresários, certamente é indesejável.
Por isso, é importante fazermos uma distinção entre empreendedores
econômicos e empreendedores políticos.
Os primeiros criam valor para a sociedade; ao passo que os últimos
simplesmente descobriram como transferir recursos de terceiros para seus
próprios bolsos.
Em
vez de apenas confiscar a riqueza dos mercantilistas — uma medida inócua que
manteria intacto todo o aparato de redistribuição dos pobres para os ricos —,
muito mais sensato seria abolir todos os arranjos que permitem o
corporativismo, o que levaria à imediata bancarrota desses mercantilistas. Curiosamente, os progressistas de hoje
parecem não se importar muito com esse arranjo.
Quando
fazemos essa distinção entre mercantilistas e genuínos empreendedores, é
possível ver a diferença entre produtores e parasitas. A desigualdade oriunda do empreendedorismo
honesto, longe de indicar que algo está errado, significa que há um progresso
generalizado na economia. Em um sistema
no qual todos melhoram sua situação por meio da atividade criativa e das trocas
voluntárias, algumas pessoas inevitavelmente irão se tornar ricas. Trata-se de uma característica natural do
sistema — um sistema que recompensa empreendedores e investidores por terem
sido bons administradores do capital.
Obviamente,
quando tais pessoas não se mostram bons administradores do capital, elas
quebram. Em outras palavras, pessoas que
fazem investimentos ruins ou que não servem bem aos consumidores não
permanecerão ricas por muito tempo — a menos que o governo decida intervir
para salvá-las.
A
menos que ela tenha enriquecido contratando advogados e lobistas em vez de
pesquisadores e criadores, uma pessoa rica enriqueceu porque criou bens e
serviços valiosos para seus consumidores.
Sendo assim, a ausência de pessoas muito ricas é um péssimo sinal em uma
economia, especialmente para os pobres.
Tal ausência, com efeito, indicaria uma das duas coisas a seguir: ou
muito pouca coisa de valor foi criada (dificilmente haveria coisas boas e
gostosas, como iPhones e trufas) ou o governo incorreu em uma predatória
política de redistribuição de renda, destruindo os incentivos para as pessoas
serem criadoras de valor e boas gestoras de capital.
No
que mais, vale a pena enfatizar que diferenças na propriedade de ativos não
significam uma igual diferença no padrão de vida, muito embora várias pessoas
tenham esse fetiche. Por exemplo, a
riqueza de Bill Gates de ser 100.000 vezes maior do que a minha. Mas será que ele ingere 100.000 vezes mais
calorias, proteínas, carboidratos e gordura saturada do que eu? Será que as refeições dele são 100.000 vezes
mais saborosas que as minhas? Será que
seus filhos são 100.000 vezes mais cultos que os meus? Será que ele pode viajar para a Europa ou
para a Ásia 100.000 vezes mais rápido ou mais seguro? Será que ele pode viver 100.000 vezes mais
do que eu?
O
capitalismo que gerou essa desigualdade é o mesmo que hoje permite com que boa
parte do mundo possa viver com uma qualidade de vida muito melhor que a dos
reis de antigamente. Hoje vivemos em
condições melhores do que praticamente qualquer pessoa do século XVIII.
Sempre
que você vir ou ouvir uma pessoa parolando sobre desigualdade, faça a si mesmo
a seguinte pergunta: será que ela está genuinamente preocupada com os pobres ou
está apenas indignada com os ricos? Eis
uma maneira de descobrir a diferença: sempre que alguém reclamar sobre a
desigualdade de renda, pergunte a ela se aceitaria que os ricos ficassem ainda
mais ricos se isso, no entanto, significasse condições de vida melhores para os
mais pobres. Se a resposta for "não",
então ela está admitindo que está importunada apenas com o que os ricos têm, e
não com o que os pobres não têm. Já se a
resposta for "sim", então a tal desigualdade de renda é irrelevante. Em outras palavras, a preocupação deveria ser
com a pobreza absoluta, e não com a
pobreza relativa.
Em
quase todas as discussões sobre desigualdade de renda, há uma básica dinâmica
emocional atuando. Uma pessoa descobre
que possui menos do que a outra, e passa ter a inveja. Já outra descobre que tem mais do que o
resto, e passa se sentir culpada.
Inveja, culpa e indignação. São
realmente essas emoções primitivas que deveriam conduzir as políticas
públicas?
Toda
essa ideia de igualdade econômica não representa nenhuma genuína forma de
compaixão. Quando é somente uma ideia, é
fraca. Quando se torna política pública,
torna-se um desastre em larga escala.
O
fato de que pessoas livres não são iguais em termos econômicos não deve ser
lamentado. Ao contrário, é motivo de
regozijo. A desigualdade econômica,
quando oriunda da interação voluntária de indivíduos criativos, e não de
conexões políticas, é um testemunho do fato de que as pessoas estão sendo elas
mesmas, cada qual colocando seus talentos e aptidões ímpares para funcionar de
maneiras que são gratificantes para elas próprias e que geram bens e serviços
valiosos para terceiros. Como diriam os
franceses em um contexto mais diferenciado, Vive
la difference!
Fonte:Mises
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