Certa vez, participei de um debate sobre
economia em uma universidade. O então
reitor daquela universidade, que defendia a necessidade de a economia ser
estritamente regulada pelo governo, recorreu ao seguinte argumento contra mim:
Suas
teorias sobre livre mercado, propriedade privada e governo limitado funcionavam
bem no século passado, quando a sociedade era menor, a economia era menos
interligada, e vivíamos sob arranjos mais simples. Hoje, no entanto, tais
teorias seriam simplesmente inviáveis pelo simples fato de que a economia na
qual vivemos é muito mais complexa. Quanto mais complexa a sociedade, maior é a
necessidade de controles e regulamentações governamentais. Isso, para mim, é algo tão lógico e evidente
que chega a ser axiomático.
Essa falácia frequentemente utilizada — a
qual leva direta e logicamente a uma defesa do planejamento socialista —
possui muita influência porque é aparentemente plausível e, superficialmente,
parece ter algum sentido.
Por isso, ainda mais importante do que
desmascará-la, é fazer isso de forma simples e direta, sem recorrer a teorias complexas
e de explicações demasiado longas.
E foi essa a resposta dada por um dos
participantes daquele debate:
Muito
bem. Imaginemos então a situação mais
simples possível: apenas você e eu.
Agora, suponhamos que eu seja um indivíduo indiscutivelmente competente
e brilhante.
Com
essas qualidades em mente, você realmente crê que eu teria a competência para
determinar (1) em que você deve investir, (2) como você deve efetuar o seu
empreendimento, (3) o que você pode produzir, (4) quantas horas você pode
trabalhar, (5) qual o salário que você deve receber, (6) qual o preço que você
pode cobrar, (7) qual deve ser a sua margem de lucro, (8) com quem você deve se
associar, (9) o que você deve vender, e (10) com quem você deve comercializar?
Consequentemente,
a minha incompetência já não estaria por demais óbvia nesta forma extremamente
simples de sociedade?
E então este mesmo cidadão arrematou:
Agora,
vamos dar um passo adiante e imaginar uma sociedade mais complexa. Imaginemos uma sociedade formada por todas as
pessoas que estão nesta sala. Qual seria
a minha competência para controlar coercivamente as ações criativas de cada uma
destas pessoas aqui presentes? Seria eu
tão brilhante assim?
Por
fim, contemplemos uma situação realmente complexa: uma sociedade formada por
200 milhões de indivíduos. Se eu me
apresentasse dizendo que eu deveria estar no controle da vida de todos eles e
de todos os bilhões de trocas voluntárias que eles efetuariam diariamente, tenho
certeza de que você diria que eu estaria sofrendo de alucinações.
Logo,
não seria algo demasiado óbvio que, quanto mais complexa uma economia, maiores
serão os efeitos retardadores gerados pelos controles governamentais?
Não
seria algo lógico que, em uma economia complexa, o controle governamental sobre
os esforços produtivos irá exercer uma influência, no mínimo, restritiva sobre
essa economia?
Por
conseguinte, não seria algo axiomático afirmarmos que, quanto mais complexa a
economia, mais deveríamos recorrer às iniciativas individuais, mais deveríamos estimular
a liberdade de empreendimento e mais deveríamos usufruir os resultados gerados
por essa liberdade empreendedorial?
Nenhuma
mente individual e nem nenhuma combinação de mentes pode prefigurar, nem muito
menos controlar de maneira inteligente, as inúmeras trocas voluntárias e as
inúmeras manifestações de criatividade que ocorrem em uma sociedade
simples. Imagine, então, em uma
sociedade complexa...
O reitor não contra-argumentou. Creio, aliás, ser improvável que ele venha a
utilizar essa mesma argumentação novamente.
Embora o ato de desmascarar falácias
cotidianas possa ser comparado ao ato de apagar incêndios com um pedaço de
pano, o exercício não deixa de ser útil (além de ser um estímulo à mente). Treinar a arte da contra-argumentação sempre será
uma atividade proveitosa.
No que mais, a capacidade de desmascarar falácias
— uma tática negativa — é um prefácio necessário para se aprender a ressaltar
de maneira influente tudo aquilo que é positivo. Se uma pessoa não for capaz de demonstrar
competência em destruir teorias socialistas, ela provavelmente não atrairá grandes
multidões apenas falando sobre as maravilhas criadas por homens livres.
Dentre todas as mentiras ouvidas em salas de
aula ou em nosso dia a dia, não há absolutamente nenhuma que não possa ser
refutada. Tudo o que temos de fazer é
colocar nossa mente para funcionar.
A complexidade de um arranjo não implica
automaticamente a necessidade de centralização de poder. Você e eu já temos um trabalho em tempo
integral, que é o de cuidar de nossas respectivas vidas. Nossa carga horária aumentaria exponencialmente
caso tentássemos cuidar também da vida de algumas outras pessoas. E explodiria para além do concebível caso
tentássemos controlar as vidas de milhões de indivíduos.
Fonte:Mises
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