Lucros
são cruciais para um sistema capitalista.
A existência de lucros informa se uma determinada empresa está
utilizando seus fatores de produção de forma efetiva e eficaz.
Frequentemente
vemos e ouvimos pessoas afirmarem que a obtenção de lucros é evidência da
ganância e da cobiça do ser humano, e que isso é algo moralmente
condenável. Deixando as questões
puramente econômicas de lado, a realidade é que a obtenção de lucros não pode,
por si só, ser classificada de ganância.
O fato de uma determinada empresa ser lucrativa, por si só, não nos diz
nada de moralmente relevante. Afinal,
lucro é simplesmente o nome que a contabilidade atribui a uma situação em que a
receita é maior que os custos.
Em
outras palavras, uma empresa que aufere lucros está simplesmente vivenciando
uma situação em que o dinheiro que entra em seu caixa é maior do que o dinheiro
que ela gasta para cobrir todos os seus custos, principalmente com materiais,
imóveis, mão-de-obra e impostos.
O
contrário de lucro é prejuízo. Uma empresa
que esteja perdendo dinheiro — isto é, gastando mais do que recebe — não pode
sobreviver por muito tempo. E sua
falência significará o desemprego de várias pessoas. Portanto, sob circunstâncias normais, lucros
não apenas são uma condição necessária para o sucesso e a continuidade de um
empreendimento, como também são moralmente justos, pois garantem a renda e o
emprego de várias pessoas.
No
entanto, há sim distorções neste arranjo, e tais distorções sempre são criadas
pelo governo. Por exemplo, o governo
pode conceder privilégios a determinadas empresas, seja por meio de subsídios,
seja por meio de protecionismo, seja por meio de agências reguladoras que
fecham o mercado e protegem as empresas da concorrência externa. Em todos estes casos, um empreendimento está
sendo privilegiado à custa dos consumidores e pagadores de impostos, e seus
lucros não são moralmente defensáveis.
Porém,
algo deve ser enfatizado: este arranjo protecionista e mercantilista só pode
existir e se manter se outras empresas
não protegidas pelo governo estiverem apresentando lucros. Em outras palavras, o governo só pode
socorrer e ajudar empresas ineficientes — empresas que não apresentariam
lucros em situação de concorrência de livre mercado — se outras empresas da
economia estiverem auferindo lucros, os quais serão tributados e utilizados
para financiar tanto o aparato regulatório quanto os subsídios para as empresas
ineficientes.
Portanto,
a sustentação de arranjos protecionistas — algo bastante caro àquelas pessoas
contrárias ao livre mercado — depende inteiramente da existência de lucros
capitalistas em outros setores da economia.
É
óbvio que, quanto mais intenso e volumoso for este arranjo protecionista, mais
inquietações ele gerará entre os genuínos empreendedores. Quanto mais privilégios o governo conceder a
pessoas e empresas não-lucrativas, mais as pessoas e empresas lucrativas e
eficientes começarão a questionar por que afinal estão trabalhando tanto. Simplesmente não é justo trabalhar duro e ver
seus proventos serem confiscados para sustentar incapazes.
Uma
empresa não ser lucrativa é sinal de que algo está errado com ela: talvez seus
métodos de produção sejam ineficientes, ou suas despesas gerais estejam
excessivamente altas, ou seus produtos precisam passar por uma renovação, ou
quaisquer outras inúmeras deficiências.
Um apoio estatal a esta empresa irá simplesmente suprimir todo e
qualquer incentivo para se aprimorar, postergando reformas necessárias para
colocar a empresa novamente no caminho da sanidade econômica.
A
história é repleta de exemplos de empresas ineficientes e problemáticas que
foram socorridas pelo governo.
Atualmente, várias grandes empresas são protegidas e privilegiadas pelo
governo. Isso representa um triplo golpe
contra o público consumidor: ele se torna privado dos benefícios que uma empresa
mais eficiente, operando sob livre concorrência, traria para o mercado; ele é
obrigado a abrir mão de parte de seu dinheiro, via impostos, para ajudar
compulsoriamente as finanças destas empresas ineficientes; e, ainda pior, ele é
obrigado a pagar mais caro por produtos de pior qualidade. Afinal, não fosse o protecionismo, os
subsídios e a cartelização do mercado implementados pelo governo, haveria mais
opções de produtos, tanto importados quanto produzidos no mercado interno pela
livre concorrência.
Já
em um livre mercado, não obstruído por privilégios e protecionismos estatais,
empresas lucrativas são aquelas que descobriram uma maneira de criar e de
fornecer produtos e serviços a preços altos o suficiente para cobrir seus
custos, mas baixos o suficiente para fazer com que os consumidores os
considerem atraentes. Uma empresa
lucrativa, em outras palavras, é aquela que prospera criando e entregando bens
de valor.
Neste
arranjo, lucros e prejuízos são ferramentas que possibilitam entender a saúde
de uma empresa. Lucros indicam que os
recursos estão sendo utilizados sabiamente por uma empresa; prejuízos sugerem
que eles estão sendo alocados de forma ineficaz. Embora lucros e prejuízos não sejam o
elemento essencial de uma empresa, eles são indicadores cruciais de quão
efetivamente as necessidades e desejos dos consumidores estão sendo atendidos.
Dado
que vivemos em um mundo de escassez — o que significa que nada existe em
abundância —, os desejos humanos sempre serão maiores do que a oferta de
recursos necessários para se atender a todos estes desejos. Isso significa que é extremamente necessário
haver na sociedade algo que direcione racionalmente a alocação destes recursos
escassos. Algo ou alguém tem de informar
se a água será utilizada majoritariamente para ser bebida ou para irrigar
lavouras, e se o minério de ferro será utilizado para se fabricar automóveis ou
para se produzir tratores. O mesmo
raciocínio se aplica a todos os recursos sociais. Mesmo o tempo, que também é um recurso
escasso, requer alguma ferramenta que estimule sua alocação sensata.
Uma
solução já tentada para esse problema da alocação de recursos escassos foi a de
controlar centralizadamente todas as decisões tomadas no mercado, bem como
todos os recursos existentes no mercado.
Esta é exatamente a estratégia defendida pelo socialismo em suas
variadas formas. Como a humanidade
aprendeu amargamente, um dos problemas com essa estratégia de alocação de
recursos é que ela concentra enormes poderes em poucas mãos. Poder excessivo tende a estimular coisas
sórdidas na natureza humana.
Mas
há um outro problema com essa estratégia: o problema do conhecimento. Mesmo que a elite política que eventualmente
estivesse no controle da economia fosse moralmente perfeita, ela ainda assim
seria incapaz de coletar todas as informações necessárias para alocar de
maneira eficaz e racional todos os recursos humanos e materiais. Adicionalmente, há também o problema da
impossibilidade do cálculo econômico em uma economia em que os bens de capital
não são propriedade privada. Se os meios
de produção pertencem exclusivamente ao estado, não há um genuíno mercado entre
eles. Se não há um mercado entre eles, é
impossível haver a formação de preços legítimos. Se não há preços, é impossível fazer qualquer
cálculo de preços. E sem esse cálculo de
preços, é impossível haver qualquer racionalidade econômica — o que significa
que uma economia planejada é, paradoxalmente, impossível de ser planejada.
Estes
três problemas obstruíram e reverteram todas as economias centralmente
planejadas da história.
Felizmente,
há uma estratégia alternativa para a alocação de recursos escassos: a rede de
preços que emerge naturalmente quando compradores e vendedores efetuam trocas
voluntárias no mercado. Neste arranjo,
as leis da economia entram em
cena. Uma redução de
preço para um determinado bem sinaliza uma relativa abundância; pessoas podem
comprar mais daquele bem. Já um aumento
de preço sinaliza uma relativa escassez, obrigando as pessoas a pouparem mais
caso queiram adquirir aquele bem.
Por
meio deste sistema, em que os preços dos bens e serviços estão constantemente
em fluxo, os consumidores podem equilibrar suas necessidades em relação à
disponibilidade dos vários bens e podem saber a qualquer momento qual a
quantidade de cada bem que eles podem comprar e utilizar. Já os produtores, por sua vez, podem saber em
qual quantidade um bem deve ser produzido e vendido. Os preços nos ajudam a determinar se um bem
ou serviço está sendo desperdiçado — e, por isso, não deveria estar sendo
produzido —, ou se ele é amplamente desejado — e, por isso, deveria ter sua
produção aumentada.
Por
exemplo, quando empreendedores descobriram como prospectar, armazenar, refinar
e utilizar petróleo, o produto se tornou mais barato do que o óleo de baleia. Consequentemente, a participação do óleo de
baleia no mercado desabou e, com isso, houve menos pressão para se matar baleias
em busca de sua gordura.
O
lucro também pode ser entendido como um tipo de preço que emite sinais. Auferir lucro indica que uma empresa está realizando
suas tarefas de uma maneira que um determinado segmento do público consumidor
aprova — não apenas conceitualmente, como em opiniões coletadas por uma
pesquisa, mas principalmente por meio da decisão voluntária de abrir mão de seu
suado dinheiro em troca dos bens e serviços fornecidos por esta empresa. Já os prejuízos informam aos empreendedores,
proprietários e administradores que eles têm de realizar ajustes em seu
processo produtivo. Caso contrário, será
melhor se dedicar a outros objetivos, desta forma fazendo com que recursos
sociais não sejam desperdiçados.
Desta
forma, os sinais emitidos pelos lucros e prejuízos atendem a uma insubstituível
função econômica. A lucratividade serve
como uma força motivadora, mas também — e ainda mais importante — sinalizam
um trabalho bem-feito.
Por
último, um adendo moral: as obrigações sociais das empresas não se resumem a
fornecer bens e serviços de maneira lucrativa.
As empresas têm também de atuar honestamente, honrando seus contratos,
servindo aos consumidores com ética e estando sempre atentas às dimensões
morais do processo empreendedorial. O
sistema de preços não assegura magicamente um comportamento moral. Para dar um exemplo doloroso mas bastante
realista, o sistema de preços em uma sociedade depravada pode sinalizar que o
mais valioso uso de mulheres jovens oriundas de famílias pobres é transformá-las
em prostitutas. A confusão surge quando as
pessoas veem tais perversidades e erroneamente concluem que abolir o livre
mercado irá magicamente resolver esse problema de alguma forma.
Uma pequena reflexão já basta para revelar o
erro desta lógica. Adotar uma economia
controlada e planejada não revoga a lascívia e o egoísmo do coração
humano. Esses vícios, ao contrário, irão
prosperar e se tornar ainda mais intensos.
A diferença é que agora eles serão alimentados e protegidos por algum
braço armado do estado — com o problema adicional de que as famílias mais
pobres terão agora ainda menos alternativas econômicas, pois a economia
controlada retirou de seu alcance vários empreendimentos moralmente
preferíveis.
Embora
o sistema de preços em uma economia livre não forneça uma fundação moral para a
sociedade, e embora ele também não remova automaticamente as oportunidades para
ganhos imorais, ele facilmente supera todas as formas de socialismo no que diz
respeito a fornecer opções morais e socialmente beneficentes para se escapar da
pobreza.
Fonte:Mises
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