Para geólogo, sem articulação metropolitana e universalização do
saneamento básico, principal rio do estado seguirá sujo. Após dinheiro
do Japão, França vira aposta de Alckmin para resolver problema
Tietê e afluentes da região metropolitana da capital: de obras a projetos de habitação, despoluição não chega a resultados
São Paulo – Os projetos de despoluição e
desassoreamento do rio Tietê não terão resultados satisfatórios e
definitivos se as principais causas da deterioração de suas águas, no
passado e no presente, não forem combatidas. O primeiro fator é a falta
de saneamento básico universalizado, e o outro o assoreamento, ambos
causados pela “ação humana”, adverte o geólogo Álvaro Rodrigues dos
Santos, ex-diretor do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) do
Estado de São Paulo e autor de vários livros sobre o tema. “A qualidade
das águas responde diretamente à qualidade do sistema de saneamento
básico, competência da Sabesp com irresponsabilidades do DAEE”, diz.
“O que falta são políticas públicas bem direcionadas, estratégia bem
montada. Não com o objetivo primeiro de despoluir o Tietê, mas de dotar a
região metropolitana de um sistema de saneamento básico de primeiro
mundo”, analisa. “Não acredito que uma mágica vá nos dar um rio
despoluído antes de dotarmos a Região Metropolitana de um sistema de
saneamento de primeiro mundo.”
Como a bacia do Alto Tietê, onde está localizada a Grande São Paulo,
sofre as consequências da poluição causada por 39 municípios, o problema
se torna muito difícil de resolver. Além da magnitude do espaço
geográfico de onde vem o esgoto despejado no rio, há ainda o fato de que
nem todos os municípios são atendidos pela Companhia de Saneamento
Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), casos de Diadema, Guarulhos,
Mauá, Mogi das Cruzes, Santo André e São Caetano, atendidas por outras
empresas. Sem um projeto geopolítico envolvendo a cooperação de todos os
municípios com mediação do governo do estado, para ser chegar a uma
política de saneamento básico “de primeiro mundo”, o rio continuará
poluído.
“Uma cidade isoladamente não consegue resolver o problema, tem de ser
uma articulação metropolitana”, diz Álvaro Rodrigues dos Santos. Para
ele, as divergências entre tantas cidades com orientações e projetos
políticos diferentes dificultam, mas cabe ao governador Geraldo Alckmin
(PSDB) resolvê-las. “Aí é que tem que valer a vontade política do
governador. Se ele está com essa vontade política de resolver o problema
do saneamento básico, como governador deve reunir os prefeitos
envolvidos, dar um tapa na mesa e colocar para funcionar. E jogar isso
para a sociedade dar sustentação. Isso é vontade política.”
Por mais de duas décadas
Segundo a Sabesp, o Projeto Tietê teve início em 1992, com a
assinatura de um contrato de empréstimo com o Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID). De lá para cá, foram muitos outros contratos de
empréstimo, e nada resolvido. A última promessa de solução foi feita no
dia 13 de dezembro, quando o governador assinou com o presidente
francês, François Hollande, acordos de cooperação prevendo a troca de
conhecimentos e tecnologias entre a Sabesp e a entidade daquele país
responsável pela despoluição do rio Sena.
"Espero que não venha mais nenhuma promessa de milagre. Esses acordos
são complicados, porque acho que temos todas as tecnologias e
competência tecnológica na maior cidade da América do Sul para dar conta
disso", diz Álvaro Rodrigues.
Antes do convênio com o governo francês, o Japão foi oferecido como a
solução para todos os males do Tietê. Em 2000, ainda na administração
Mario Covas, R$ 375 milhões foram emprestados pelo país asiático para o
rebaixamento da calha. Mais tarde, já governador, Alckmin chegou a dizer
que as marginais Pinheiros e Tietê nunca mais inundariam, fruto dessa
obra, mas acabou desmentido pela chuva.
Em 2010 a Sabesp recebeu novo empréstimo de US$ 63 milhões da Agência
de Cooperação Internacional do Japão para a construção de estações de
tratamento de esgoto.
Passadas pouco mais de duas décadas desde o início do programa, o
objetivo segue sendo justamente implementar a infraestrutura de coleta e
tratamento de esgoto nas cidades atendidas pela Sabesp na Região
Metropolitana. Até 2015, o investimento chegará a US$ 3,6 bilhões, nas
chamadas primeira (1992-1998), segunda (2000-2008) e terceira fases.
A despoluição do principal rio paulista e de seus afluentes
depende de vários fatores, diz a Sabesp, por meio de sua assessoria de
imprensa, como “varrição e coleta de lixo; regularização de favelas e
loteamentos clandestinos; combate o esgoto irregular; atuação das
prefeituras nos municípios não operados pela Sabesp”.
Segundo a companhia, a terceira fase (2009-2016), em andamento,
beneficiará 1,5 milhão de pessoas com rede de coleta, e tratamento para
mais 3 milhões de pessoas. O investimento é de US$ 2 bilhões. A coleta
subirá de 84% a 87% e o tratamento, de 70% a 84%. A quarta e última fase
“vai garantir a universalização do saneamento nas áreas regulares
atendidas pela Sabesp. Essa etapa está em fase de financiamento e estará
concluída até o fim desta década”, informa a empresa.
“Não adianta só um grande sistema de coleta. Tem que ir levando esse
sistema de coleta organizado e toda a infraestrutura à periferia”, diz
Rodrigues dos Santos.
Assoreamento
Fora a questão do (ou da falta de) saneamento, o outro aspecto,
igualmente grave, é o assoreamento. Segundo o geólogo, uma das
principais causas das enchentes na cidade e na metrópole, decorrentes do
volume de sedimentos oriundos dos processos erosivos nas zonas
periféricas em expansão da cidade. “Chegam à rede cerca de 4 milhões de
metros cúbicos desses sedimentos por ano. Com todos esses bilhões que
foram investidos no alargamento e aprofundamento da calha, para
aumentar a capacidade de vazão, não se consegue resolver o problema.”
O assoreamento não é provocado por causas naturais como chuvas e o
próprio curso das águas, como muitos acreditam, mas pela ação humana.
“São promovidas por movimentos de terra, terraplenagem, seja casa a
casa, sejam grandes empreendimentos imobiliários. São processos erosivos
provocados pelo homem”, explica. “E absolutamente nada é feito para
conter esse problema em sua causa, a erosão, e joga-se tudo no
desassoreamento. São centenas de milhões de reais por ano gastos no
desassoreamento da rede de drenagem. É um absurdo que não se trabalhe
concomitantemente num projeto de redução do volume de sedimentos que
chegam.”
De acordo com o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), o
governo Geraldo Alckmin, já investiu R$ 358,9 milhões no desassoreamento
de 4,5 milhões de metros cúbicos do Tietê. “Somando os investimentos no
desassoreamento também de seus principais afluentes, esses números
totalizam R$ 562,3 milhões e a retirada de 7,4 milhões de metros cúbicos
de detritos. O Tietê nunca esteve tão desassoreado, sua calha
encontra-se de acordo com a sua batimetria original, e os trabalhos de
desassoreamento - que são contínuos -, seguem dentro do cronograma
estipulado”, afirma a autarquia, por meio da assessoria de imprensa.
Segundo o geólogo do IPT, costuma-se apontar o lixo como causa de
enchentes, mas esse é um mito. “O lixo urbano realmente atrapalha, mas
está muito longe de ser o vilão das enchentes. Do volume que chega ao
Tietê, apenas 5% é lixo. 95% são sedimentos arenosos que vêm dos
processos erosivos, provocado pelo avanço da cidade sobre uma região
cada vez mais montanhosa, com trabalhos de terraplenagem cada vez mais
extensos, expondo o solo à erosão”. Culpando o lixo, esclarece
Rodrigues, “as autoridades jogam a responsabilidade nas costas da
população, uma coisa extremamente cômoda. O lixo provoca alagamentos
localizados. Sobre o processo geral de enchentes não tem a mínima
influência.”
Recentemente, Alckmin prometeu que em 2019 o estado teria 100% do
esgoto tratado. “O Fleury nos prometeu que ia beber um copo d’agua do
Tietê antes da virada do século”, lembra o ex-diretor do IPT,
referindo-se ao ex-governador peemedebista (1991-1995) Luiz Antônio
Fleury Filho.
Fonte:RedeBrasilAtual
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