Como
seria se tivéssemos o seguinte sistema econômico?
Este
sistema inundaria o globo com bens gratuitos diuturnamente, não pedindo nada em
troca e dando praticamente tudo para todos.
A maior parte de tudo aquilo que ele gerasse consistiria de bens
gratuitos, e todos os seres humanos vivos teriam acesso a eles.
Qualquer
indivíduo que acumulasse lucros privados o faria unicamente porque serviu com
excelência aos outros seres humanos, e tal sistema inevitavelmente faria com
que esta pessoa revelasse suas ideias e truques: todas as pessoas do planeta
saberiam os motivos do sucesso de alguém.
Este
sistema, desta forma, serviria a todas as raças e classes. Ele serviria farta e servilmente ao homem
comum e derrubaria as elites quando estas se tornassem soberbas e
arrogantes. Ele faria com que fosse
benéfico e proveitoso para todos incluir cada vez mais pessoas em seu potencial
produtivo e dar a todas elas uma participação nos resultados.
Tal
sistema tem um nome. Ele se chama livre
mercado. Embora ele tenha se tornado bem
mais óbvio na atual era digital, o fato é que a proliferação de bens gratuitos
sempre foi uma das principais características do capitalismo. O problema é que as pessoas raramente pensam
e falam sobre isso.
Com
efeito, o livre mercado é a ideia mais mal compreendida e mal interpretada que
existe, tanto por seus detratores como também, e com muita frequência, por seus
proponentes. Quanto ao clichê de se
caracterizar o mercado como uma utopia para exploradores, magnatas e
fraudadores, as pessoas que realmente pensam assim provavelmente nunca de fato
tentaram ganhar dinheiro em um sistema competitivo. Eles não sabem como isso é extremamente
difícil. Todo o processo é seriamente
enviesado contra os ganhos privados. E
isso gera enormes custos ao público.
Eu
até poderia aprofundar-me mais na teoria, porém, algumas vezes, exemplos
pessoais ilustram mais eficientemente a ideia que se quer passar. Apenas para esclarecer, nós não vivemos em
livre mercado atualmente. Ao contrário,
o mais intrusivo e poderoso aparato de intervenção e coerção interfere continuamente
e implacavelmente em nosso mercado. Mas
ainda há neste mundo alguns resquícios de mercado suficientes para nos dar uma
ideia de como ele funciona, e de como seria o mundo caso ele pudesse operar
livremente. Algumas vezes, o mais
simples exemplo já é o suficiente.
Assim,
permita-me falar sobre uma barbearia que, por acaso, descobri ontem. As pessoas que lá trabalham cortam o cabelo
de seus clientes, obviamente. Mas elas
também disponibilizam mesas de pingue-pongue, alvos para arremesso de dardos,
sinuca e cerveja grátis que você pode beber em um balcão.
Entrei
no estabelecimento com um amigo e fiquei atônito ao ver a mesa de
pingue-pongue. Então perguntei: "Podemos jogar?" Elas responderam:
"Ora, é claro." E então meu amigo e eu jogamos feito crianças
desbravando um brinquedo novo.
Finalmente,
após um bom tempo, falei: "Com licença, eu gostaria de cortar o meu cabelo." Ao mesmo tempo em que ficaram contentes com o
meu pedido, eles se mostraram muito surpresos, pois imaginaram que eu fosse
apenas mais uma pessoa que houvesse ido ali apenas para jogar pingue-pongue,
algo já rotineiro naquele estabelecimento!
Eles já estavam perfeitamente contentes apenas em ter me deixado brincar
de graça.
Após
o corte de cabelo, fiquei por ali bebendo uma cerveja gratuita, ainda
mesmerizado com aquele extraordinário empreendimento de risco. Até que finalmente decidi perguntar se eles
tinham uma página no Facebook. "É
claro", foi a resposta. Tirei uma foto
do local, postei na minha página do Facebook, "curti" a página deles e, em
poucos minutos, pessoas de todo o mundo estavam comentando sobre este pequeno
estabelecimento. "Salon de barbier avec tables de pool et
pingpong, dards et bière gratuite", disse um francês que compartilhou
aquela foto que girou a rede.
Agora,
pense comigo: ao agir assim, eu fiz algum favor a este estabelecimento? Seus proprietários provavelmente creem que
sim. Afinal, trata-se de um
empreendimento recém-lançado. Qualquer
propaganda, estímulo, elogio ou promoção será certamente muito bem-vindo. No entanto, veja o outro lado deste meu ato:
sem querer, acabei imediatamente alertando absolutamente todos os outros
potenciais concorrentes sobre esta grande ideia, algo que eles podem implantar
já amanhã para atrair mais clientes.
Todas as barbearias da cidade podem agora "roubar" esta ideia. Elas podem comprar uma mesa de pingue-pongue,
arrumar um engradado de cerveja, pregar na parede um alvo de dardos e pronto:
já estarão em pé de igualdade para concorrer com aquele estabelecimento que
originalmente teve esta ideia.
Tenho
certeza de que esta barbearia adoraria encontrar uma maneira de se
tornar
amplamente conhecida pelo maior número possível de clientes sem que,
para isso,
tivesse também de revelar seus truques para seus concorrentes. Mas sabe
de uma coisa? Isto é absolutamente impossível. Uma coisa vem
inevitavelmente junto com a
outra. Informação é um bem não-escasso; uma
vez revelada, ela pode ser consumida e utilizada por qualquer pessoa que
se
deparar com ela.
Sendo
assim, o que ocorreu com a vantagem competitiva que este novo e esforçado
estabelecimento até então desfrutava?
Ela está agora seriamente ameaçada.
Este estabelecimento certamente irá enfrentar uma feroz concorrência,
inclusive de grandes redes que podem implantar estas sugestões em poucos dias e
a custos muito baixos. A característica
que tornava este local bacana e divertido poderá agora ser copiada por
absolutamente qualquer empreendedor da cidade.
Se isso acontecer, este novo estabelecimento irá enfrentar uma súbita
pressão em suas receitas e registros contábeis.
Ele será forçado a pensar em outras inovações.
É
claro que temos de admitir também que todas as outras barbearias podem ainda
não estar muito certas sobre se esta combinação de salão, pingue-pongue,
cerveja, sinuca e dardos é realmente o passaporte mágico para o sucesso. Logo, em vez de copiar esta estratégia de
imediato, elas podem preferir esperar um pouco para ver como a coisa vai
funcionar para o adotante inicial da ideia.
Tudo pode ser um fracasso. Mas
pode também ser um assombro. Se for um
assombro, outros irão adotar a prática.
Mas há um problema: aquele que primeiro teve a ideia possui uma vantagem
competitiva. Ele já conseguiu uma
clientela leal e uma base de apoiadores.
Bilhões
de informações (bens gratuitos e não-escassos!) chegam a empreendedores
diariamente, permitindo que eles copiem os sucessos (e fracassos) de outros. Saber o que implementar e o que não
implementar é parte essencial da função do empreendedor. Pode, aliás, ser a parte mais difícil de seu
trabalho.
Mas
este é o meu ponto: é impossível ser bem-sucedido no mercado e não revelar a
"receita secreta" para o sucesso. Se
você é bem-sucedido, todos os concorrentes acabarão sabendo qual foi a fórmula
adotada e irão copiá-la. Felizmente, não
há patentes ou direitos autorais sobre coisas como colocar uma mesa de
pingue-pongue em uma barbearia; logo, o governo não pode impedir que o
conhecimento e a aprendizagem da concorrência ocorram. E é assim que as coisas funcionariam em um
mercado puramente livre, em todos os setores.
Ser bem sucedido significa fornecer coisas — fornecer bens e serviços
para seus clientes (esta é a chave para a lucratividade) e, como consequência,
revelar para todos os concorrentes o método que o tornou bem-sucedido (ou que
resultou em seu fracasso). O próprio ato
de empreender — que sempre tende a ser uma tarefa livremente copiável — por
si só já transforma seus métodos em objeto de estudo.
A
informação que você revela é o preço que você paga em sua busca pelo
lucro. E qualquer lucro que você obtiver
sempre estará ameaçado por concorrentes que irão emular o seu sucesso. Isto significa que você jamais pode se
acomodar; você jamais pode se contentar com sua situação atual. Você tem de estar sempre inovando e
renovando, constantemente — e você tem de fazer isso sempre tentando ofertar
ao público exatamente aquilo que ele quer, e da maneira mais eficiente
possível. É isso que dá ao mercado
tamanho dinamismo, que o impulsiona e que explica seu espírito inovador e
inventivo.
São
enormes as chances de você estar lendo este artigo em um foro totalmente
gratuito. Talvez você o tenha visto em
um website pelo qual você não pagou para ler ou o viu sendo divulgado em alguma
rede social pela qual você não paga para usar.
Estes são bens gratuitos, meios que os capitalistas utilizam para atrair
o interesse das pessoas para os empreendimentos que eles estão fazendo.
Mas
estes bens gratuitos são apenas a parte inicial de tudo que o mercado oferece. O mais valioso bem gratuito que o mercado
produz a cada minuto é o oceano de informação sobre sucessos e fracassos, sobre
os que as pessoas querem e o que elas não querem, sobre o que funciona e o que
não funciona. Esta vasta reserva de
informação está sendo divulgada globalmente, de modo contínuo, e funciona como
se fosse um chuveiro jorrando bênçãos sobre a civilização. As redes digitais elevaram a bênção a níveis
que ninguém jamais imaginou serem possíveis de alcançar.
O
exemplo da barbearia pode não parecer nada espetacular, mas se você o entender
— se você realmente o entender, e conseguir ver toda a dinâmica que ele revela
—, então você irá entender o mecanismo que retirou todo o mundo de seu estado
primitivo e o elevou à gloriosa prosperidade que se difunde continuamente por
todo o globo. Isto nada mais é do que o
mercado em ação — a rede de trocas, de cooperação, de serviços, de inovação,
de emulação e de competição que faz com que o mundo gire, tudo a serviço do
bem-estar humano. Quanto mais mercado
tivermos, mais progresso vivenciaremos.
Portanto,
façamos a pergunta: por que tantas pessoas se dizem contrárias ao livre
mercado? Só pode ser porque elas não
entendem como ele realmente funciona.
Gostaria muito de poder convidar essas pessoas a se juntarem a mim para
uma cerveja e uma partida de pingue-pongue e então perguntar a elas como acham
que foi possível criar este pequeno pedaço de céu aqui na terra.
Fonte:Mises
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