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28 de outubro de 2013

Crítica: O Conselheiro do Crime

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Você não conhece alguém até que saiba o que ele quer.
“O crime não compensa” é uma lição velha, mas provavelmente é uma das mais sábias que qualquer um de nós já ouviu. O cinema e a realidade tem, há tempos, nos mostrado que ainda que existam aqueles que se dêem bem sendo foras-da-lei, geralmente a probabilidade de que as coisas dêem errado é bem maior.

E o pior de tudo, como “O Conselheiro do Crime” (“The Counselor”) bem nos mostra, quando algo dá errado em um negócio em que não se confia em ninguém, ninguém sai limpo.

O mundo é um lugar ruim. Pessoas fazem coisas ruins, coisas que a maior parte de nós nem conseguiria pensar. Na realidade do filme, isso não muda, e não deixamos de ver o pior lado das pessoas. Essa essência é resumida nas palavras do personagem de Brad Pitt: “Você pode pensar que existem coisas que as pessoas são simplesmente incapazes de fazer. Não existem.” Aproveitando a direção de Ridley Scott com roteiro por Cormac McCarthy (autor de “Onde os Fracos Não Tem Vez”), vemos rapidamente que não há escapatória.
O Conselheiro (Michael Fassbender) é um advogado bem-sucedido. Sua vida é feliz, especialmente depois que acaba de pedir Laura (Penélope Cruz) em casamento. Mas as coisas começam a dar errado quando aceita entrar em um negócio milionário de tráfico de drogas com Reiner (Javier Bardem),  ainda que o amigo Westrey (Brad Pitt) o tenha avisado que poderiam haver problemas.
O problema é que cada um tem seus próprios interesses e planos – incluindo a misteriosa Malkina (Cameron Diaz), namorada de Reiner. Quando uma intriga criminosa atrapalha a entrega que fecharia seu negócio, o Conselheiro se torna alvo do Cartel mexicano, e se vê despreparado para enfrentar as consequências do mundo do crime.
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“O Conselheiro do Crime” é a história de um homem – ou de muitas pessoas, na verdade – perdendo o controle das circunstâncias. Isso já é real para o público desde o começo. Conforme conhecemos os personagens, notamos que existem vários interesses e que há um grande plano, um negócio, mas só aprendemos seus detalhes conforme eles acontecem. Quando tramas paralelas começam a mostrar um segundo plano criminoso avançando, nos vemos acuados, no escuro.
Não existem explicações claras para muitos dos fatos, e só conforme tudo evolui que vemos a importância. As peças vão se encaixando, e o que antes eram cenas que pareciam soltas, sem propósito, mostram um grande plano que já estava claramente delimitado desde o começo.
Nessa mesma linha, o filme se prevê inteiro em falas. Isso não é um exagero, várias declarações são resumos de pontos-chave da trama antes que aconteçam, às vezes nem mesmo disfarçados. Mas ainda assim, eles vão te surpreender. Só tenha em mente que, seja tematicamente ou literalmente, não existem diálogos inocentes.
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Inclusive, os bandidos, advogados e correlatos, durante toda a produção, soltam ótimas pérolas de filosofia e sociologia de maneiras inesperadas. Há muito o que pensar sobre cada uma das declarações dentro e fora da história.
O Conselheiro é um herói trágico: nesse meio que para nós parece caótico, ele, geralmente acostumado a ter o controle da situação, se torna o mais condenado de todos os personagens. Conforme a trama avança, ele deixa de ser o “Conselheiro” para ser quem recebe conselhos.
De certo modo, isso ocorre desde o começo, mas quando ele se vê precisando buscar ajuda, vemos que já é tarde demais, tornando tudo mais crítico e dramático. Ver os outros personagens chamá-lo de “Counselor” (a legenda em português indica “Doutor”, fazendo referência a seu papel como advogado) parece uma piada de mau gosto.
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Outra máxima que dita os temas do filme é que “ Você não conhece alguém até que saiba o que ele quer.” Enquanto ficamos no escuro, não temos nem como suspeitar até onde os personagens conseguem chegar, e tudo que querem conseguir. Ninguém aqui é totalmente bom, nem mesmo o Conselheiro, que seria o “menos ruim” de todos, mas é fato que para a crueldade não há limites.
É difícil não se apegar a personagens, especialmente quando todo o elenco mostra ótima atuação, mas também não faltam surpresas quanto à sobrevivência. É praticamente impossível prever quem irá durar até o fim da trama e quem vai sobreviver, e isso vale para todos os personagens. Essa sensação de que ninguém é intocável, em termos narrativos, colabora para a crueza e crueldade da produção, sendo extremamente positiva ao mesmo tempo que se soma ao mal-estar que muitas partes causam no público.
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Espere um filme mais focado em planos e diálogos do que em ação, mas quando essa acontece, não deixamos de nos impressionar por sua crueza e violência. Assassinatos a sangue frio são mostrados em detalhes até grotescos, e a execução das sequências de ação são impecáveis. Menos frequente, mas ainda presente, há um conteúdo sexual relativamente forte, tematicamente. Uma cena de Cameron Diaz é especialmente… estranha.
O “real” excessivo do filme é apoiado por diversos detalhes interessantes, seja o roteiro intrincado, sujeito a todas as desgraças da vida real e mais, quanto ao excelente trabalho de guarda-roupas, caracterização e cenário. Os objetos e casas dos personagens contam histórias, e às vezes suas aparências também. A personagem de Cameron Diaz é um exemplo perfeito, tanto pelas estranhezas que a vemos fazendo em cena como pelas suas tatuagens e seu dente de ouro. São detalhes irrelevantes para a trama, ao mesmo tempo que inseparáveis do conceito de sua personagem.
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Dentre as falas que prevêem e resumem a história, um dos momentos iniciais de Reiner é um ótimo aviso para o público: “Conselheiro, se você seguir por este caminho, você vai chegar inevitavelmente a decisões morais que o surpreenderão completamente. Você não terá como prevê-las.” – “O Conselheiro do Crime” tem surpresas interessantes e um estilo que pode tanto agradar quanto confundir ou até ofender. E esse é seu principal mérito.
Fonte:POP

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